Maria Antônia Josefa Joana de
Habsburgo-Lorena (em alemão:Maria
Antonia Josepha Johanna von Habsburg-Lothringen; francês:Marie
Antoinette Josèphe Jeanne de Habsbourg-Lorraine) (Viena, 2 de novembro de 1755 - Paris, 16 de outubro de 1793) foi umaarquiduquesa da Áustria e rainha consorte de França e Navarra.
Décima quinta e penúltima filha de Francisco I, Sacro Imperador
Romano-Germânico, e da imperatriz Maria Teresa da Áustria, casou-se em abril
de 1770, aos quatorze anos de idade, com o então delfim de França (que subiria ao trono em maio de 1774
com o título de Luís XVI), numa tentativa de estreitar os laços
entre os dois inimigos históricos.
Detestada pela corte francesa, onde era
chamada L'Autre-chienne(uma paronomásia em francês das palavras autrichienne, que significa
"mulher austríaca" e autre-chienne,
que significa "outra cadela"), Maria Antonieta também ganhou
gradualmente a antipatia do povo, que a acusava de perdulária e promíscua e de
influenciar o marido a favor dos interesses austríacos.[1]
Depois da fuga de
Varennes, Luís XVI foi deposto e a monarquia abolida em 21 de
setembro de 1792; a família real foi
posteriormente presa na Torre do
Templo. Nove meses após a execução de seu marido, Maria Antonieta
foi julgada, condenada por traição, eguilhotinada em 16 de outubro de 1793.
Após sua morte, Maria Antonieta tornou-se
parte da cultura popular e uma figura histórica importante,[2] sendo o assunto de vários livros,
filmes e outras mídias. Alguns acadêmicos e estudiosos acreditam que ela tenha
tido um comportamento frívolo e superficial, atribuindo-lhe o início da Revolução Francesa; no entanto, outros
historiadores alegam que ela foi retratada injustamente e que as opiniões ao
seu respeito deveriam ser mais simpáticas
A
infância
Maria
Antonieta aos 7 anos de idade, óleo de Martin van
Meytens, (1762), no Palácio de
Schönbrunn.
Nascida no Palácio Imperial de Hofburg, Maria Antonieta
era a penúltima dos dezesseis filhos da imperatriz Maria Teresa da
Áustria e de Francisco I,
Sacro Imperador Romano-Germânico. Batizada Maria Antônia Josefa
Joana, era tratada em família e na corte pelo apelido afrancesado de Antoine (mais tarde, em França, passaria
a ser chamada Marie Antoinette). Aos dois anos de idade, ela contraiu uma forma
branda de varíola, mas recuperou-se
sem ter na pele as marcas características da doença. Apesar da rigidez de sua
educação e da etiqueta da corte, a arquiduquesa foi descrita como bastante
espontânea.
Teve uma infância despreocupada, bastante mimada
por sua governanta, a condessa Brandeiss, que lhe fazia todas as vontades e lhe
dava o amor maternal que a imperatriz, sempre envolvida nos assuntos de estado,
não teve tempo de dedicar-lhe. A condessa comprazia-se em transmitir à menina os
princípios religiosos e morais adequados às arquiduquesas, mas também reduziu
seu período de estudos diários.Como resultado, aos 12 anos, Antônia não falava
nem escrevia corretamente os idiomas francês e alemão e só falava elegantemente
o italiano graças aos esforços de seu professor Pietro Metastasio.Teve como
professor de música o compositor Christoph Willibald
Gluck, que a ensinou a tocar harpa, mas destacou-se especialmente
por sua forma graciosa e refinada de dançar.
Em 18 de agosto de 1765, em Innsbruck, durante as celebrações do casamento
do arquiduque
Leopoldo, o imperador sofreu um derrame e morreu. Este acontecimento
abalou profundamente todos os filhos de Francisco I e levou Maria Teresa a
submeter-se a um pesado luto pelo resto de sua vida. A imperatriz nomeou seu filho
mais velho (o futuro José II)
como seu co-regente e assumiu uma postura de extrema rigidez com seus filhos
menores: se anteriormente ela os havia neglicenciado pelo excesso de trabalho,
passou vigiar-lhes de perto, repreendendo-os constantemente e demonstrando
frequente insatisfação com seu comportamento. Em 1767, os planos da imperatriz
de expandir ou construir novas alianças foram quase completamente destruídos
por uma epidemia de varíola que atingiu até mesmo a família imperial. Para
compensar as severas perdas, ela casou Maria Carolina com Fernando I das Duas
Sicílias e Maria Amália com Fernando I de Parma. O
casamento de Carolina muito entristeceu Antônia porque elas compartilhavam
profundos laços de afeição, amizade e cumplicidade
Casamento
político
A
arquiduquesa aos 14 anos de idade, no retrato oficial enviado a Versalhes. Pastel de Joseph Ducreux (1769).
Maria Teresa usou Antônia como um "peão"
no jogo político para cimentar uma nova aliança com o arqui-inimigo secular da
Áustria: a França. Após longas negociações, comandadas pelo francês duque de Choiseul e pelo austríaco príncipe de
Starhemberg, acertou-se o compromisso da jovem comLuís Augusto, delfim de França.
Em novembro de 1768, o abade de Vermond partiu para
Viena, como tutor de Antônia. A arquiduquesa, embora bela e inteligente, também
era descrita como preguiçosa e indisciplinada e não tinha o conhecimento
necessário para desempenhar o papel de rainha. O abade submeteu Antônia a um
programa educacional projetado especialmente para ela, onde substituiu o estudo
de livros por longas palestras que versavam sobre história, religião e
literatura francesa. O programa obteve bons resultados e o tutor ficou
encantado com os progressos de Antônia.
Em 13 de junho de 1769 o noivado foi oficialmente
anunciado. Os detalhes para o matrimônio foram meticulosamente preparados
durante e Antônia teve seu dote fixado em 200 mil coroas (com igual valor em
jóias). Nos poucos meses que antecederam o casamento, Maria
Teresa tentou recuperar a relação com a filha, dividindo seus aposentos com ela
nas últimas noites antes da partida para a França. Em 19 de abril de 1770 foi
celebrado o casamento por procuração. A partir desse momento Antônia foi
oficialmente chamada de "Marie Antoinette, Dauphine de France".
Em 21 de abril de 1770, seguida por um suntuoso
cortejo de cinquenta e sete carruagens, Maria Antonieta deixou Viena
permanentemente. Embora devesse esquecer suas origens austríacas e tornar-se
uma francesa de corpo e alma, como se esperava de toda rainha consorte de
França, a jovem delfina preferiu seguir as instruções de sua mãe, que lhe
ordenou no momento da despedida: "Continue sendo uma boa
alemã". A imperatriz continuaria a
intimidar sua filha nas cartas mensais expedidas para Versalhes, onde lembrava a
fidelidade que a jovem devia à Casa d'Áustria.
Após duas semanas de viagem e sendo elogiada por onde
passava, a delfina chegou a Shüttern, na margem do Reno oposta a Estrasburgo. Em um pavilhão de madeira construído
especialmente para a ocasião em uma pequena ilha no Reno, teve lugar a
cerimônia da remise, durante a qual Maria Antonieta trocou seus trajes
austríacos pelos franceses. A delfina despediu-se definitivamente de seu
séquito para ser acolhida por um cortejo francês, chefiado pela condessa de
Noailles, recentemente nomeada "Grã-Mestra da Casa da
Delfina".
O cortejo retomou a marcha para Compiègne, onde a delfina era esperada pela
corte francesa, incluindo o rei Luís XV, o delfim e o
duque de Choiseul, que foi ao encontro da jovem e auxiliou seu desembarque.
Maria Antonieta disse-lhe:"Nunca esquecerei que você foi o defensor de
minha felicidade!" O casal viu-se pela primeira vez e a delfina notou
que seu marido era muito diferente do descrito durante as negociações de
casamento: era desajeitado, inábil e já bastante forte para sua idade; os
retratos enviados para a Áustria haviam favorecido grandemente sua aparência.
O casamento foi celebrado em 16 de maio, numa
cerimônia solene em Versalhes, e todo o povo foi convidado a festejar a alegria
da família real. Após o jantar, iniciou-se a cerimônia do coucher a qual, pela etiqueta, deveria
ser presenciada por toda a corte. O casal foi para a cama e o leito nupcial foi
abençoado pelo arcebispo. Ao final da cerimônia os noivos foram deixados a sós,
mas o casamento não foi consumado.
Madame la
Dauphine
Devido ao ódio cultivado pela Áustria, Maria
Antonieta não era vista com bons olhos pela maior parte da corte francesa. As Mesdames Tantes (tias de Luís Augusto), a quem a
delfina se aproximou por conselhos de sua mãe, foram as primeiras a chamá-la
pelas costas de "A Austríaca". Até mesmo o delfim tinha ódio
pelos austríacos e seu tutor, o duque de La Vauguyon, alimentava esse
sentimento contra a entourage de Maria Antonieta, composta
unicamente por amigos do ministro Choiseul: o abade Vermond, a condessa de
Noailles e o embaixador austríaco conde de Mercy-Argenteau.
As Mesdames e o delfim exultaram quando o
ministro foi demitido, em 24 de dezembro de 1770, enquanto Maria Antonieta se
dava conta de que seu marido havia se casado sob coação e que a aliança
franco-austríaca, que Maria Teresa procurava por todos os meios manter, não era
bem vista por todos em Versalhes. Provavelmente, era devido aos
seus preconceitos que Luís Augusto, mesmo muitos meses após o casamento, ainda
não havia tocado a delfina. Ele sentia um estranho sentimento de repulsa contra
ela: segundo um relatório do primeiro cirurgião de Luís XV, o delfim não sofria
de qualquer deformidade, mas de uma barreira psicológica devido a sua educação
preconceituosa.
A delfina
em trajes de montaria. Pastel
de Joseph
Kreutzinger, (1771), no Palácio de
Schönbrunn.
A corte de Versalhes especulava quando o casamento
teria sido consumado. A fim de controlar o comportamento de sua filha, Maria
Teresa encarregou o conde de Mercy-Argenteau de enviar-lhe relatórios
detalhados sobre a consumação do casamento. Ingenuamente, Maria Antonieta
confidenciava tanto ao conde quanto ao abade os motivos pelos quais temia
escrever à mãe. A delfina nunca suspeitou que eles foram os primeiros a
traí-la, informando a soberana sobre aquilo que ela tentava esconder.
Meses se passaram sem que a situação se alterasse.
A imperatriz criticava constantemente a filha, por sua incapacidade em
despertar paixão no marido, que raramente dormia com ela, e de promover os
interesses da Casa d'Áustria. Mais tarde, ela passou a ofender Maria Antonieta de
forma direta, acusando-a de falta de beleza e de talento e tratando-a por
fracassada, especialmente após o casamento do conde de Provença com Maria Josefina de
Saboia e do conde d'Artois com Maria Teresa de
Saboia.[nota 5] No entanto, com o passar do tempo
e seguindo os conselhos de sua mãe, a delfina conseguiu conquistar a simpatia,
se não o amor, do delfim, que confidenciou às suas tias que achava sua mulher
"muito atraente".
Enquanto isso, as Mesdames incentivavam as hostilidades dos
herdeiros do trono contra a Madame du Barry, amante do rei e responsável
pela demissão de Choiseul. Embora o desprezo para com a favorita unisse o jovem
casal, sua postura de tácita condenação à vida privada de Luís XV os afastava
fortemente do soberano. Maria Antonieta, então, decidiu não dirigir a palavra à
amante real, apesar das ordens contrárias de sua mãe transmitidas pelo conde
Mercy. Ainda que mantivesse seu temor por Maria Teresa, foi a primeira vez que
a delfina descumpriu uma ordem materna.
O comportamento da filha enfureceu Maria Teresa,
que lhe enviou uma severa repreensão dizendo que sua conduta estava colocando
em crise a aliança franco-austríaca. Finalmente, após sete meses, Maria
Antonietta capitulou: em 1 de janeiro de 1772, dirigiu à Madame Du Barry apenas estas palavras: "Há muitas pessoas em
Versalhes hoje." A situação foi contornada, mas representou uma
grande humilhação para a delfina: "Eu lhe falei uma vez, mas
estou decidida a não fazê-lo novamente e aquela mulher não ouvirá mais o som de
minha voz", disse
ao marido. Nem o conde Mercy nem Maria Teresa jamais puderam
imaginar o mal que fizeram ao orgulho e à integridade da jovem.
Em 8 de junho de 1773, uma multidão entusiasmada
saudou a entrada oficial dos herdeiros ao trono da França em Paris. O festival
atingiu o seu clímax quando os delfins surgiram à noite na varanda das Tulherias.
Em 22 de julho de 1773 o delfim apresentou a Luís XV "sua mulher",
dizendo que naquela noite havia sido finalmente capaz de consumar o casamento.
O rei abraçou o casal com alegria. Na verdade, depois de vários e desajeitados
intercursos sexuais, o delfim só havia conseguido deflorar sua esposa, mas foi
incapaz de completar o ato.
Na primavera de 1774, Maria Antonieta trouxe seu
antigo professor de música, Christoph Gluck, para encenar uma ópera composta
por ele: Iphigénie en Aulide. Em 19 de abril, foi a primeira vez
em que a delfina serviu de anfitriã à toda a família real e foi um sucesso. Poucos dias após a apresentação
da ópera, o rei Luís XV passou mal após uma caçada, sendo diagnosticado com
varíola e morrendo em 10 de maio. Com apenas 18 anos, Maria Antonieta tornou-se
rainha da França. Ao saber da notícia, Maria Teresa escreveu ao embaixador
Mercy: "O destino de minha filha não pode ser
grandioso nem muito infeliz. Creio que seus melhores dias se foram!"
Primeiros anos de reinado
Logo, o comportamento e a falta de respeito dos
cortesãos afastaram Maria Antonieta da antiga nobreza da corte. Tais condutas
não seriam toleradas por uma rainha francesa, especialmente se ela nascera como
altiva arquiduquesa da Áustria. A popularidade da rainha começou lentamente a
declinar: começaram a circular panfletos escandalosos, principalmente
pornográficos, contra ela, que passou a ser chamada de Madame Scandale.
Maria Antonieta também foi acusada de influenciar a
política de seu marido, embora os ministros escolhidos por Luís XVI, Jean-Frédéric
de Maurepas e o conde de Vergennes, fossem fortemente
anti-austríacos e muito determinados em não permitir a interferência da rainha
e da Casa d'Áustria na política francesa. Em sua vida privada, Maria
Antonieta estava insatisfeita: seu casamento, para grande desagrado da
imperatriz, não tinha sido consumado e as esperanças de nascimento de um
herdeiro para o trono desapareciam. Sob a fachada de frivolidade e alegria da
rainha estava a melancolia de uma mulher frustrada e insatisfeita. Neste período, ela sentia
necessidade de entregar-se a divertimentos dispendiosos, como os caros e
extravagantes vestidos da modista Rose Bertin, os colossais penteados de
Léonard e até mesmo os jogos de azar.
Na primavera de 1775, o criticado programa
econômico do ministro das finanças Jacques Turgot,
levou a graves distúrbios, com a eclosão de motins em toda a França, conhecidos
como a "Guerra da Farinha". Foi nessa ocasião que se atribuiu
falsamente a Maria Antonieta a frase: "Se o povo não tem pão, que
coma brioches! "
Maria
Antonieta tocando harpa na corte francesa. Pintura de Jean-Baptiste Gautier Dagoty (1777),
no Palácio de Versalhes.
No verão do mesmo ano, Maria Antonieta conheceu Yolande de
Polignac, que viria a tornar-se sua melhor amiga. Yolande apresentou
a rainha para a comitiva da família Polignac, que iria dominar a corte por
anos. Em 6 de agosto
de 1775 sua cunhada, a condessa d'Artois,
deu à luz um filho, oduque d'Angoulême,
terceiro na linha de sucessão ao trono (atrás apenas de seu tio e seu pai). Naquele dia, Maria
Antonieta foi insultada na corte e trancou-se em seus aposentos, aos prantos. Isto gerou a circulação de
panfletos que destacavam a impotência do rei e à busca do prazer sexual pela
rainha, tanto com homens como com mulheres. Entre os amantes atribuídos à Maria
Antonieta estavam seus amigos mais próximos: a princesa de Lamballe e seu cunhado, o conde d'Artois.
Em agosto, o rei presenteou a esposa com o Petit Trianon, um anexo construído anos antes para a Madame de Pompadour que a rainha havia restaurado de
acordo com seu pessoal gosto neoclássico, onde prevalecia a simplicidade e a
elegância. Pouco depois a França mergulhou numa crise financeira: à dívida contraída
durante a Guerra dos Sete Anos foram adicionadas as despesas da
participação na Guerra de
Independência Americana. Em 1776, Turgot foi demitido e em seu lugar
foi nomeado ministro das finanças o banqueiro suíço Jacques Necker, que tentou, sem sucesso,
reduzir os custos excessivos da corte.
Em 18 de abril 1777, o imperador José II chegou a Paris para investigar
porque o casamento entre sua irmã e seu cunhado ainda não havia sido consumado.
Maria Antonieta rapidamente passou a relatar ao irmão sua difícil situação
conjugal. Acreditava-se que Luís XVI sofria de fimose e que necessitasse de uma
intervenção cirúrgica para poder realizar o ato sexual. No entanto, após conversar com o
rei, José II chegou à conclusão de que ele tinha ereções satisfatórias, mas não
conseguia mantê-las após a penetração por tempo suficiente para ejacular, o que
tornava a cópula um ato de dever e não de prazer. O imperador também concluiu que
sua irmã não tinha apetite para o sexo nem, tampouco, desenvoltura (situação muito
diferente daquela descrita nos panfletos). Segundo ele, o rei e a rainha da
França eram "dois perfeitos confusos."
Depois de esclarecer o assunto com o rei, José II
passou a criticar a irmã por sua frivolidade, seu desperdício e suas amizades. Em carta ao irmão Leopoldo,
o imperador declarou: "Ainda é muito infantil e essencialmente pura
e virtuosa." Ao retornar à Áustria, José II deixou várias
recomendações por escrito, intencionalmente exageradas, a fim de assustar sua
irmã e fazê-la adotar um estilo de vida mais sério. A rainha, angustiada com a
carta, reconheceu seus erros e prometeu ao irmão corrigir seu comportamento.
Graças aos conselhos fraternos, Maria Antonieta se reaproximou do rei e, em 18
agosto de 1777, o casamento foi oficialmente consumado.
A
maternidade
No início de 1778 estourou a guerra de sucessão da
Baviera. A rainha, sofrendo pesada chantagem psicológica pela mãe e habilmente
manipulada pelo embaixador Mercy, esforçou-se para promover os interesses
austríacos junto ao marido, mas isso despertou a oposição dos ministros do rei
e a desconfiança de parte dos súditos. A partir de então, Maria Antonieta
passou a ser chamada "a austríaca"
Na primavera desse ano, seguindo os conselhos de
Mercy, a rainha retomou a vida conjugal com seu marido e ficou grávida. Como a
situação política não se alterava, sua família austríaca a acusava de ser
inútil aos interesses da aliança; mas sua única preocupação era com o bem-estar
do herdeiro que estava gerando. Em 19 de dezembro de 1778, Maria Antonieta deu à
luz, sendo seu parto assistido por toda a corte, como determinava a etiqueta.
Devido a algumas complicações pós-parto, a soberana teve uma hemorragia e perdeu a consciência. Somente mais
tarde ela foi informada que havia dado à luz uma menina, que recebeu o nome de Maria Teresa Carlota.
Naqueles anos, concluiu-se a restauração do Petit Trianon e dos jardins adjacentes. Inimiga
de qualquer tipo de limitação e convicta de que as rainhas tinham direito a uma
vida privada, Maria Antonieta passou a habitar o palacete, longe da sufocante
etiqueta de Versalhes e dos escândalos dos cortesãos. Nesse mesmo período, a amizade
com a condessa de Polignac tornou-se mais forte, levantando rumores de um
suposto relacionamento homossexual entre elas. Porém, o que mais enfureceu
muitas pessoas foram os privilégios e os altos cargos que a rainha reservava à
amiga e à sua camarilha, numa época em que se começava a falar seriamente em
redução de custos. A gota d'água veio em outubro de 1780, quando o
conde de Polignac recebeu o título de duque e sua esposa o privilégio de um tabouret, um banquinho dobrável que lhe
dava permissão de sentar-se na presença da soberana.
Em Viena, a imperatriz ficava cada vez mais
angustiada em pensar que sua filha fora manipulada por um círculo de
"supostos amigos" que a afastavam da vida na corte. Ela tentou avisá-la,
explicando-lhe suavemente, sem o habitual tom autoritário, que os problemas
eram inerentes às funções de Estado, mas que os inconvenientes causados quando
elas não eram cumpridas eram muito piores que os pequenos inconvenientes de se
apresentar em público. A rainha, no entanto, minimizou a influência que seus
amigos tinham sobre ela. Em 29 de novembro de 1780 a imperatriz Maria Teresa
morreu. Quando Maria Antonieta recebeu a notícia, desmaiou de dor. Grata ao
marido por ter ficado ao seu lado naqueles momentos dolorosos, ela voltou a
aproximar-se dele e, em fevereiro, já se falava de outra gravidez.
Em maio de 1781, Necker renunciou por recomendação
do conde de Maurepas, que viria a falecer em novembro. Em julho, José II voltou
a visitar a irmã e foi durante esse encontro que surgiram as primeiras
acusações contra a rainha: especulava-se que ela gastaria grandes somas de
dinheiro do tesouro real com o irmão. Entretanto, os boatos eram falsos.
Em 22 de outubro de 1781, para alegria do rei e da
nação, a rainha deu à luz o tão desejado sucessor ao trono, que recebeu o nome
de Luís José. Depois de dar um herdeiro ao Estado, Maria Antonieta poderia
legitimamente ser considerada a rainha da França. Ainda que a felicidade pelo
nascimento do delfim tenha se espalhado por todo o país, não impediu a
circulação de panfletos satíricos que questionavam a paternidade da criança. A
reputação da rainha, já minada pelos rumores sobre seus modos displicentes,
saiu ainda mais danificada.
A
hostilidade popular
No final do Verão de 1782, estourou o escândalo da
falência Guéménée, levando a princesa de Guéménée, governanta dos Fils de France, a pedir demissão do cargo. A
tarefa foi então assumida por Yolande de Polignac, aumentando os boatos sobre
as duas amigas e a antipatia contra a soberana. Enquanto isso, entre 1782 e 1783,
Maria Antonieta iniciou, próximo ao Petit Trianon, uma pequena vila de doze casas
(nove dos quais ainda estão de pé). Baseada em uma pintura de Hubert Robert e projetada por Richard Mique, a vila ficou conhecida como Hameau de la
Reine. Essa
busca por uma vida simples, inspirada no mito da Arcádia de Virgílio e Teócrito, foi considerada escandalosa e
inadequada para uma rainha.
Maria
Antonieta com vestido de musselina branca e chapéu de palha. Pintura de Elisabeth Vigée-Le
Brun (1783).
Nessa época, José II pediu à irmã que convencesse
seu marido a apoiar a Áustria e a Rússia na partição do Império Otomano. De fato, Maria Antonieta,
tentando promover os interesses austríacos, aproximou-se mais uma vez do
marido, engravidando em seguida. Todavia, desta vez, as manobras da rainha não
surtiram resultados úteis para os Habsburgo. Em 1 de novembro de 1783, já em
adiantado estado de gravidez, ela sofreria um aborto espontâneo, do qual
levaria meses para se recuperar. Numa prolongada fase depressiva, Maria
Antonieta sofreu grande influência da duquesa de Polignac, que conseguiu obter
dela nomeação de Charles Alexandre de
Calonne como controlador-geral de finanças. A política desastrosa de Calonne levou
a França à completa insolvência e, nos anos seguintes, tornou-se
um dos maiores inimigos da rainha.
Em 1784, o rei proibiu a encenação de As Bodas de Fígaro de Beaumarchais pelo conteúdo explícito que ia
contra os interesses da aristocracia. A rainha e
sua comitiva fizeram várias representações ao rei, que terminou por levantar a
proibição. O espetáculo, representado diante da rainha e do rei Gustavo III da
Suécia, foi um grande sucesso. O soberano sueco, que viajava
incógnito a Paris, alertou Maria Antonieta sobre o conteúdo perigoso da peça e
ela acusou sua entourage de induzi-la a fazer Luís XVI
mudar de ideia sobre a proibição. Estes seriam os primeiros sinais de
desentendimento entre a rainha e a duquesa de Polignac. Logo após a partida do rei da
Suécia, Maria Antonieta descobriu que estava grávida novamente.
Ao mesmo tempo, José II, que travava a chamada
"Guerra Silenciosa" ou "Guerra das Marmitas" contra os
holandeses, inquiriu sua irmã sobre uma possível intervenção de Luís XVI a seu
favor, mas o rei recusou. Em carta, Maria Antonieta explicou ao irmão que não
tinha qualquer influência sobre o rei nas questões políticas. Por fim, Luís XVI interveio e
comprometeu-se a pagar uma quantia em dinheiro à Holanda em nome da Áustria, ação
atribuída à influência da rainha. A dedicação de Maria Antonieta à Casa
d'Áustria escandalizou muitas pessoas na corte, aumentando sua impopularidade
já constantemente alimentada por panfletos difamatórios e pelas maledicências
sobre seu comportamento frívolo e leviano. A rainha passou a ser odiada tanto
pelo povo quanto pela maior parte da corte.
Com o avanço da gravidez, Maria Antonieta convenceu
o rei a comprar do duque de Chartres o Castelo de
Saint-Cloud. A exorbitante quantia gasta na transação acirrou ainda
mais o ódio contra ela, especialmente porque o castelo não foi adquirido como
um bem do Estado, mas como propriedade privada da rainha da França. Em 27 de março de 1785, nasceu o
terceiro filho do casal real, que foi batizado como Luís Carlos.
O caso do
colar
O colar
de diamantes no centro do escândalo. Seu custo foi de 1.600.000 livres, o equivalente a cerca de 500 kg de
ouro.
Em 1785, a rainha, que vinha atuando como atriz no
teatro do Petit Trianon, decidiu encenar a famosa comédia O Barbeiro de
Sevilha de Beaumarchais. Em 12 de julho, enquanto ela
ensaiava, recebeu um bilhete de Boehmer, o joalheiro da corte, agradecendo-lhe
por ter comprado um colar e lembrando-lhe que a data de pagamento da primeira
parcela se aproximava. Maria Antonieta não entendeu do que o bilhete tratava e
acabou queimando-o.
A verdade sobre o assunto veio à tona pouco depois.
Boehmer estava convencido de que havia vendido um colar de diamantes para a
rainha, tendo o cardeal de
Rohan como avalista, a quem Maria Antonieta não dirigia a
palavra havia mais de uma década. Em 15 de agosto, perante o rei e
a rainha, Rohan foi questionado sobre o assunto, sendo preso em seguida diante
dos cortesãos presentes na Sala dos Espelhos. Antes de ser levado em custódia,
Rohan conseguiu que seus cúmplices destruissem quase todos os documentos
comprometedores sobre o caso. Alguns dias depois ele foi preso na Bastilha. As
investigações realizadas pela coroa apontaram que o cardeal, tentando
aproximar-se de Maria Antonieta, havia sido enganado pela condessa Jeanne de La
Motte-Valois, que também foi presa e levada para a Bastilha. Durante
algum tempo, a condessa fez ver ao cardeal que ela era amiga íntima da rainha,
graças a uma longa correspondência falsa e um encontro, ocorrido durante a
noite nos jardins de Versalhes, com uma prostituta chamada Nicole D'Oliva,
vestida como Maria Antonieta. Sabedora da existência do colar de Boehmer, a
condessa de La Motte fez com que o cardeal o comprasse e entregasse à ela. A
jóia, desmontada em várias peças, foi vendida em Londres pelo marido da
condessa.
Em 25 de agosto, Maria Antonieta exigiu um
julgamento público para mostrar a todos que era inocente. Após um longo processo, concluído
em 31 de maio de 1786, os resultados foram os seguintes: apesar de culpado do crime de lesa-majestade,
Rohan foi absolvido e todas as acusações que pesavam contra ele foram
declaradas inexistentes; assim, o parlamento de Paris mostrou que ousava
desafiar a autoridade do rei. A condessa de La Motte, no entanto, foi condenada a
ser marcada publicamente como ladra e à prisão perpétua na Salpêtrière. A absolvição de Rohan não foi
apreciada pela corte de Versalhes e Luís XVI mandou-o para o exílio.
Profundamente abalada, Maria Antonieta deu-se conta de sua imagem perante a
opinião pública: uma mulher má, que dilapidava os cofres do Estado, manipulava
o soberano a favor dos interesses do imperador austríaco e traía o marido para satisfazer
seus instintos lascivos.
Nesse meio tempo, a rainha cortou parte de suas
despesas e adotou um estilo de trajar mais sóbrio e adequado à uma soberana. Grávida pela quarta vez em pleno
andamento do processo, Maria Antonieta deu à luz em 9 de julho de 1786 uma
menina prematura que recebeu o nome de Maria Sofia
Helena Beatriz. Fora do palácio, entretanto, a rainha foi alvo de
numerosos panfletos pornográficos e satíricos, surgidos após o caso do colar.
Atividade
política
Maria
Antonieta com seus filhos. Pintura de Élisabeth Vigée-Le Brun (1787).
A grave crise financeira iniciada em 1783
agravou-se a tal ponto que o rei, em acordo com o ministro Calonne, decidiu
convocar a Assembleia dos Notáveis (após uma pausa de 160 anos) numa
tentativa de implementar algumas reformas necessárias para aliviar a situação o
país. Mesmo estando ausente das reuniões, Maria Antonieta foi acusada de tentar
frustrar seus propósitos. A verdade é que, com ou sem a presença da rainha, a
Assembleia revelou-se infrutífera e Luís XVI demitiu Calonne. Maria Antonieta
permanecia sem se intrometer na política interna, aceitando passivamente as
decisões do marido, como quando o rei ignorou a indicação de um candidato
pró-Áustria para o cargo de ministro dos negócios estrangeiros. Nessa ocasião,
a rainha declarou ao embaixador Mercy que "não era justo que a corte
vienense nomeasse ministros na corte de Versalhes."
O rei, porém, caiu em depressão profunda e Maria
Antonieta, que nunca havia aspirado o poder, viu-se obrigada a abandonar sua
vida frívola e tratar dos assuntos de Estado. Surpreendentemente, a política da
rainha revelou-se radicalmente anti-austríaca, demonstrando que sua principal
preocupação era a estabilidade da França para o bem de seus herdeiros, os Fils
de France. Em maio, para substituir Calonne como ministro das Finanças, o
rei nomeou o arcebispo Loménie de Brienne, um
aliado político da rainha, que a aconselhou a fazer grandes cortes em suas
despesas e nas de seus amigos. A redução dos gastos não melhorou sua
popularidade, mas afastou-a de seus amigos e a população passou a compará-la a Fredegunda e Isabel da
Baviera - as mais terríveis e odiadas rainhas de França.
Brienne não obteve melhores resultados que seu
antecessor e, em 25 de maio, a Assembleia de Notáveis foi dissolvida.
Considerada responsável por esses fracassos, Maria Antonieta tentou em vão
reagir com a sua ingênua propaganda, deixando-se retratar por Madame Vigée Le Brun junto aos filhos, como a mãe da
França. No mesmo período, Jeanne de La Motte escapou da
prisão e fugiu para Londres onde, sob a proteção de Calonne, publicou suas
memórias contra a rainha.
A política do rei, que exilou o parlamento de Paris
em 11 de novembro, favoreceu aqueles que apoiavam seu primo, o duque de
Orléans. Do Palais-Royal, sua residência em Paris, ele começou uma intensa
campanha contra a coroa e, especialmente, contra a rainha, de quem o duque
sentia um ódio particular. Os percalços aos quais o rei e a rainha foram
submetidos acabaram por prejudicar sua saúde: Luís XVI sofreu uma violenta
crise de erisipela, enquanto a
soberana, devido a algum distúrbio não diagnosticado, passou a engordar. Após a eclosão de vários tumultos
o rei, em 8 de julho e 8 de agosto, anunciou sua intenção de convocar os Estados Gerais,
tradicional órgão legislativo que não era convocado desde 1614.
Maria
Antonieta com um livro. Último retrato oficial da rainha pintado por Elisabeth Vigée-Le Brun
(1788).
A rainha não esteve diretamente envolvida no exílio
do parlamento, nos editais de maio ou na convocação dos Estados Gerais. Sua
principal preocupação, entre o final de 1787 e o início de 1788 foi frágil
saúde do delfim, num estágio avançado de tuberculose que lhe havia provocado o
encurvamento da coluna vertebral. Ela foi, no entanto, o
artífice da chamada de Jacques Necker para ocupar novamente o cargo de
ministro das finanças, em 26 de agosto; uma jogada populista e arriscada, pois
a rainha sabia que o povo se voltaria contra ela se a nomeação do suíço não
estabilizasse as finanças do país. Sua previsão se concretizou
quando o preço do pão começou a subir devido ao inverno rigoroso (um dos mais
frios da história) entre 1788 e 1789 e após a má colheita do verão anterior.
Várias revoltas eclodiram por toda a França: padarias foram saqueadas e as
tropas enviadas para abrir fogo contra a multidão.
Em 4 de maio de 1789 teve lugar o desfile de
abertura dos Estados Gerais. Maria Antonieta foi o principal alvo da multidão
que gritava, à sua passagem, a frase: "Viva o duque de
Orléans". No dia seguinte, quando os três
estados reuniram-se em Versalhes, a rainha foi recebida com silêncio na sala. Os soberanos não tomaram parte
nos acontecimentos daqueles dias, preocupados que estavam com a agonia do
delfim. De fato, Maria Antonieta permaneceu em Meudon,
ao lado do filho, até a morte deste, na noite de 4 de junho, aos oito anos de
idade. O casal real velou o corpo do filho por toda a
noite mas, devido as regras de etiqueta, não puderam assistir aos funerais na Basílica de
Saint-Denis. A morte do delfim, que normalmente causaria comoção
nacional, foi praticamente ignorada pelo povo francês, mais preocupado com as
reuniões dos Estados Gerais e esperançoso de melhorias sociais. "Meu filho está morto e não
parece importar a ninguém!", exclamou a rainha. Quando o Terceiro Estado
declarou-se uma Assembleia Nacional auto-constituída no salão de tênis, surgiram rumores de que a
rainha desejava banhar-se no sangue dos cidadãos. Na verdade, nesse momento a
rainha encontrava-se em profunda depressão pela morte do filho.
A
Revolução
Retrato
de Maria Antonieta pintado em 1791 por Alexandre
Kucharsky, pintor da corte após a fuga de Elisabeth Vigée-Le Brun
para o exterior.
Nas semanas que se seguiram, muitos dos
monarquistas conservadores, incluindo o conde d'Artois e a duquesa de Polignac,
fugiram da França por temerem uma onda de assassinatos. Maria Antonieta, mesmo
angustiada por saber que sua vida corria perigo, decidiu ficar para ajudar o
marido a restabelecer a tranquilidade, embora o poder do rei tivesse sido
progressivamente limitado pela Assembleia Constituinte que, então sediada em
Paris, passou a recrutar homens para a Guarda Nacional.
No clima do Grande Medo que varreu o país entre julho e
agosto, a figura de Maria Antonieta personificava os horrores de uma sangrenta
contra-revolução. Em 1 de outubro, foi oferecido no Palácio de Versalhes um jantar em honra doRégiment
de Flandres (regimento de infantaria regular do exército real),
evento que foi noticiado em Paris como orgia anti-revolucionária. Em 5 de outubro, uma multidão
armada, composta em sua maioria por mulheres, marcharam sobre
Versalhes para exigir pão e apresentar uma petição ao rei. Na
manhã de 6 de outubro os apartamentos reais foram invadidos, havendo mortes
entre os manifestantes e os guardas. A família real, então, foi forçada a
voltar para Paris, sendo alojada no Palácio das
Tulherias e sob a vigilância.
Maria Antonieta escreveu aos seus amigos, dizendo
que não tinha intenção de vincular-se ainda mais à política francesa porque,
participando ou não, tudo seria inevitavelmente atribuído à ela e que temia as
repercussões de um maior envolvimento. Apesar da situação, a rainha continuou a
desempenhar suas funções na distribuição de esmolas e nas cerimônias
religiosas, mas dedicava a maior parte de seu tempo aos filhos. Nas Tulherias, a família real
estava virtualmente em prisão domiciliar e, muitas vezes, era alvo de insultos
recebidos da rua. A rainha permanecia confinada no palácio; raramente aparecia
em público e vestia-se com simplicidade. Porém, sua atitude reservada foi
interpretada negativamente e ela passou a ser acusada de frieza e
distanciamento.
Pastel
inacabado de Alexandre
Kucharsky mostrando Maria Antonieta pouco antes da Fuga de Varennes. No canto inferior esquerdo
pode-se ver o golpe da baioneta de um revolucionário.
Em fevereiro de 1790, Luís XVI foi forçado a
aprovar a Constituição. Nessa época começaram os contatos entre o soberano e o conde de
Mirabeau, um nobre simpatizante da revolução que decidiu ajudar a
monarquia, orientando-a para um modelo constitucional. Embora Maria Antonieta
desaprovasse a conduta moral do conde, aceitou sua ajuda. Mirabeau, por sua
vez, admirava a rainha por sua determinação "viril", chegando mesmo a
declarar: "O rei tem apenas um homem com ele: sua
mulher!"
Em troca de dinheiro, o deputado teria enviado
várias notas aos soberanos a fim de esclarecer-lhes a situação política, de
acordo com seu ponto de vista. Mirabeau conseguiu incluir na carta constitucional
significativas melhorias na situação do rei, trazendo alguma tranquilidade aos
soberanos. No exterior, os Luís XVI e Maria Antonieta eram vistos pelos
monarquistas emigrados como traidores da causa monárquica enquanto, em Paris, o
rei era visto como um traidor nação e, como tal, merecedor da pena de morte. Todas essas fontes de
preocupações contínuas e diárias (todos os dias surgiam rumores de atentados
contra a rainha ou de seu encerramento num convento) envelheceram precocemente
a jovem rainha, que contava apenas 35 anos. O constante medo da morte, sua e
de sua família, a marcaram profundamente. Em 2 de abril de 1791, Mirabeau
morreu.
Em 21 de junho de 1791, a família real tentou fugir
para os Países Baixos
Austríacos , mas, a poucos quilômetros da fronteira, próximo à
cidade de Varennes-en-Argonne, foi
reconhecida, presa e levada de volta a Paris. Durante a viagem, foram atacados
e insultados. A tentativa de fuga acabou por destruir a já abalada idéia da
sacralidade da pessoa do rei. Começou-se a pensar que um rei que havia traído a
nação e ainda tentava fugir, já não era necessário nem mesmo ao Estado.
Enquanto isso, Maria Antonieta continuava com um
jogo duplo: por um lado, retomou os contatos com as cortes da Europa a procura
de apoio; por outro, contava com a ajuda de Antoine Barnave, um jovem político moderado que
conhecera no retorno de Varennes, para tirar a monarquia do impasse em que se
encontrava devido à tentativa de fuga. A rainha, no entanto, não se deu
conta de que o jovem não tinha nem mesmo um lampejo da influência que Mirabeau
exercia sobre a Assembleia, a qual estava muito mais em consonância com a fúria
do povo contra os soberanos. Apesar disso, Barnave escreveu várias cartas para
o casal real, tentando convencê-los a abandonar o movimento
contra-revolucionário e a aceitar a Constituição, cujos principais itens,
segundo palavras de Maria Antonieta a Mercy, eram uma "série de absurdos
irrealizáveis."
Finalmente, em 14 de setembro de 1791, o rei
ratificou a primeira constituição francesa. Mais tarde, solicitado pela
Assembléia, Luís XVI declarou guerra à Áustria mas, em junho de 1792, usou seu
poder de veto contra a deportação de padres refratários (clérigos que tinham
jurado fidelidade à Constituição) e a formação de um corpo de soldados
provinciais a serem alocados nos arredores de Paris. Em 20 de junho de 1792, o
povo em armas atacou pela primeira vez o Palácio das Tulherias. A membros da
família real foram novamente insultados, mas mantiveram a compostura diante de
cada ameaça.
Os acontecimentos de 20 de junho foram apenas um
ensaio geral do que aconteceria em 10 de agosto. Nesse dia houve o mais
sangrento ataque ao palácio, que marcou a derrocada final da monarquia
francesa. No ataque morreram todos os guardas suíços (Cent-Suisses) do
rei e muitos nobres permaneceram para defender a família real, que se refugiou
na Assembleia Nacional. Por ordem da Comuna, a família real foi transferida
para Torre do Templo, um antigo mosteiro dos Templários utilizado à época como prisão. Os
soberanos, seus filhos e a irmã do rei foram encarcerados;Madame Campan, primeira camareira da
rainha, e a princesa de Lamballe não tiveram autorização de acompanhá-los. Esta
última foi morta e esquartejada durante os massacres de
setembro e sua cabeça foi levada em procissão sob as janelas
da rainha, que desmaiou de horror. Poucos meses depois, iniciou-se o
processo que condenou Luís XVI à morte na guilhotina, em 21 de janeiro de 1793, na atual Place de la Concorde, em
Paris.
A viúva
Capeto
Após a morte do rei, a viúva Capeto, como Maria
Antonieta passou a ser chamada, viveu vários meses em confinamento na Torre do
Templo com sua filha Maria Teresa, sua cunhada Isabel e o delfim (Luís XVII para os legitimistas). Nesse período, o chevalier de Jarjayes (um general
monarquista) conseguiu entrar no cárcere e propor um plano de fuga para a
rainha, mas ela recusou-se a sair sem seus filhos. A pedido da Convenção, Luís
Carlos foi separado da família em 3 de julho. Segundo Maria Teresa relataria
mais tarde, Maria Antonieta opôs-se fortemente à determinação, apenas cedendo
quando os carcereiros ameaçaram usar de violência contra o delfim. A educação de Luís Carlos foi
confiada a Antoine Simon, um sapateiro analfabeto. Sua tarefa era colocar o menino
contra a mãe para que ele fosse usado como arma no julgamento de Maria
Antonieta. Em 6 de outubro, Luís Carlos assinou uma declaração
em que acusava sua mãe de tê-lo iniciado em práticas masturbatórias e
incestuosas.
Maria Antonieta foi transferida para a prisão da Conciergerie em 2 de agosto de 1793. A
ex-rainha, muito doente e sofrendo de uma grave hemorragia, encontrou consolo na leitura e
nos cuidados de Rosalie Lamorlière, a camareira da prisão, que cuidou dela.
Durante sua estadia na Conciergerie foi organizado um novo plano de
fuga pelo chevalier de Rougeville, que também não foi
bem sucedido. A Convenção acumulava petições pedindo a execução
do ex-rainha e, em 5 de outubro, foi pronunciado um discurso contra ela, onde
foi chamada "a vergonha da humanidade e do seu sexo". Em um interrogatório preliminar
foi feita uma referência clara à sua acusação: alta traição. Foi-lhe perguntado
se ela tinha ensinado "a arte da dissimulação" ao marido, com a qual o rei tinha
enganado o povo da França; Maria Antonieta respondeu: "Sim, o povo tem sido
enganado, tem sido cruelmente enganado, mas não por meu marido ou eu." A ex-rainha continuava a
acreditar nos preceitos da monarquia absoluta, instituída por Deus, e de acordo
com essa lógica, qualquer um que ousasse se rebelar contra ela deveria ser
considerado um criminoso e ser condenado à morte. As lógicas da monarquia e da
revolução eram absolutamente inconciliáveis.
Processo
e execução
Em 14 de outubro, perante o Tribunal
Revolucionário, Maria Antonieta foi comparada às rainhas más da antiguidade e
da Idade Média. A acusação pretendia apresentá-la como responsável
por todos os males da França desde sua chegada ao país. O processo baseava-se
fundamentalmente em três acusações: "esgotamento do tesouro
nacional", "negociações e
correspondências secretas" com o inimigo (Áustria e
monarquistas) e "conspiração contra a segurança nacional e a
política externa do Estado". Era evidente que a ex-rainha seria julgada por
alta traição.
Quarenta e uma testemunhas arroladas pela
promotoria denegriram e insultaram Maria Antonieta, que foi acusada de
conspiração de assassinato, falsificação de assinaturas e traiçoeira revelação
de segredos aos inimigos da França. A rainha defendia-se com vigor e não
constatou-se em seu depoimento nenhuma contradição. O deputado Jacques-René Hébert apresentou ao tribunal uma
acusação de incesto contra Maria Antonieta que, à época, estava impedida de ver
seu filho, de apenas oito anos. A ex-rainha permaneceu impassível, até que foi inquirida novamente.
Visivelmente agitada, ela levantou-se e exclamou: "Se não respondo, é porque a
própria natureza se recusa a responder a tal acusação feita contra uma mãe!
Faço um apelo a todas as mães presentes." Maria Antonieta teve o apoio dos
cidadãos da audiência e o julgamento foi interrompido por dez minutos. Quando Robespierre soube do episódio, amaldiçoou
Hebert por ter dado à ex-rainha seu "último triunfo
público".
Maria Antonieta conduzida ao patíbulo. Esboço de Jacques-Louis David.
Ao final do processo, a ex-rainha esperava ser
condenada à deportação. Ela estava certa de não ter cometido os crimes dos
quais era acusada, pois só havia tentado salvar a monarquia da forma como a
compreendia; mas isso foi considerado alta traição pela república francesa. No entanto, seu julgamente era
evidentemente uma farsa, pois o veredicto já havia sido decidido previamente
e o júri a condenou por unanimidade à pena de morte. Maria Antonieta ouviu a
sentença sem dizer uma palavra. De volta à cela, foi-lhe dado material para
escrever seu testamento, enviado à sua cunhada, Madame Isabel:
"É a ti, minha irmã, que
escrevo pela última vez. Acabo de ser condenada, não a uma morte vergonhosa,
pois esta é tão somente para os criminosos, mas a que me juntará ao teu irmão.
Inocente como ele, espero mostrar a mesma firmeza que ele em seus últimos
momentos. Estou calma, como quando a consciência nada tem a condenar. Lamento
profundamente deixar meus pobres filhos; sabes que eu só vivia para eles e para
ti, minha boa e terna irmã. Tu, que por amizade, sacrificou tudo para estar
conosco, em que posição te deixo!
Eu soube, através dos advogados
de defesa, que milha filha está separada de ti. Ai de mim! A pobre criança, não
me atrevo a escrever-lhe, ela não receberá minha carta. Eu nem mesmo sei se
esta chegará a ti. Recebas, pelas duas, minha benção. Espero que um dia, quando
forem mais velhos, eles possam reencontrar-te e desfrutar plenamente de teus
ternos cuidados. Acredito que nunca deixei de inspirá-los, que os princípios e
o estrito cumprimento de seus deveres são a base primária da vida, que sua
amizade e confiança mútua os façam felizes.
Minha filha, por sua idade, deve
sempre ajudar o irmão, inspirando-o com os conselhos de sua maior experiência e
sua amizade; que meu filho, por sua vez, tenha pela irmã todos os cuidados, os
obséquios que a amizade possa inspirar; finalmente, que ambos sintam que, em
qualquer posição em que se encontrem, estarão felizes por sua união. Que eles
nos tomem como exemplo. Quanto consolo nos dão nossos amigos em nossos
infortúnios e, na felicidade, como é dobrada quando podemos compartilhá-la com
um amigo; e onde encontrar mais ternura, mais bem querer que em sua própria
família?
Que meu filho nunca esqueça as
últimas palavras de seu pai, as quais eu repito expressamente: que ele nunca
tente vingar nossas mortes! Tenho que te falar sobre algo muito doloroso para
meu coração. Sei como esta criança deve te causar problemas; perdoa-o, minha
querida irmã, pensa em sua idade e em como é fácil dizer a uma criança o que
desejas, e mesmo assim ele não entende. Um dia virá, eu espero, em que ele se
sentirá melhor e valorizará tua bondade e tua afeição por ambos. Ainda tenho
alguns pensamentos para confiar-te. Eu queria escrever desde o início do
julgamento, mas não me deixavam, as coisas aconteceram tão rápido que, na
verdade, eu não teria tido tempo.
Morro na religião Católica,
Apostólica e Romana, a de meus pais, aquela em que fui criada e que sempre
professei. Não tendo nenhum consolo espiritual a esperar, sem saber se aqui
ainda existem sacerdotes dessa religião, e mesmo (se existissem ainda padres) o lugar (a prisão) onde eu estou os exporia a muito
riscos, se eles me falassem, ainda que fosse só uma vez. Eu peço sinceramente
perdão a Deus por todas as faltas que eu cometi desde que nasci. Espero que em
Sua bondade, Ele possa receber meus últimos votos, assim como tem feito a tanto
tempo, porque desejo que Ele receba minha alma em Sua grande misericórdia e
bondade. Eu peço perdão a todos aqueles que conheço, e a Vós, minha irmã, em
particular, de todos os sofrimentos que, sem querer, poder-lhe-ia ter causado;
eu perdoo todos os meus inimigos pelo mal que me têm feito. Despeço-me de meus
tios e de todos meus irmãos e irmãs. Eu tive amigos. A ideia de sermos
separados para sempre e suas penas são os maiores arrependimentos que carrego
ao morrer; que eles saibam, ao menos, que pensei neles até o último momento.
Adeus, minha boa e terna irmã.
Possa esta carta chegar até você. Pense sempre em mim. Eu te abraço de todo meu
coração, assim como minhas pobres e queridas crianças. Meu Deus, quanto me
corta o coração deixá-las para sempre! Adeus, adeus! Não vou mais me ocupar com
meus deveres espirituais. Como não sou livre nas minhas ações, irão trazer-me,
talvez, um padre, mas eu protestarei e não lhe direi uma palavra e irei
tratá-lo como um completo estranho."[134]
Na manhã de 16 de outubro, Maria
Antonieta, que havia sido proibida de vestir-se de preto, trajava um vestido
branco (a cor do luto para as antigas rainhas de França). Em seguida, o carrasco Henri
Sanson, após cortar-lhe o cabelo até a altura da nuca, amarrou suas mãos às
costas. A ex-rainha foi levada para fora da prisão e
colocada no carro dos condenados à morte. O esboço de Jacques-Louis David e os relatos de cronistas da
época retratam Maria Antonieta durante o trajeto para a guilhotina: sentada, as
mãos amarradas atrás das costas, os cabelos cortados grosseiramente, os olhos
fixos e vermelhos.
Chegando à Place de la Revolution, Maria Antonieta subiu
rapidamente os degraus do cadafalso. Ao pisar acidentalmente no pé do
carrasco, disse-lhe: "Perdão, senhor. Eu não fiz de
propósito." Às 12h15m, a lâmina caiu sobre seu pescoço. O carrasco pegou sua cabeça
ensanguentada e apresentou-a ao povo de Paris, que gritava:"Viva a
República!"
A
"Rainha-mártir"
Túmulo de
Maria Antonieta na Basílica de
Saint-Denis.
Após a execução, os restos
mortais de Maria Antonieta foram enterrados em uma vala comum no Cemitério de
Madeleine, na rue d'Anjou. Quando a notícia de sua morte espalhou-se pela
Europa, todos as cortes decretaram luto. A rainha Maria Carolina de
Nápoles sofreu de maneira particular pela morte de sua irmã
favorita tentando, inclusive, abandonar o idioma francês (o mais falado na
época). Luís Carlos (aclamado pelos monarquistas europeus
como Luís XVII) teve sua cela lacrada em 19 de janeiro de 1794, vivendo em condições desumanas em
meio a detritos, ratos e parasitas, o que piorou seus problemas de saúde. Libertado após a queda de
Robespierre, Luís Carlos morreu em 8 de junho de 1795. Maria Teresa, por sua
vez, foi libertada em dezembro de 1795, aos dezessete anos de idade, graças à
uma troca de prisioneiros entre a França e a Áustria. Em 1799, ela casou-se com
seu primo, o duque d'Angoulême, mas não
teve filhos. Vivendo no exílio desde a revolução de 1830, Maria
Teresa morreu em 1851, em Frohsdorf. Durante o
reinado de Napoleão, outra
arquiduquesa austríaca viria a ocupar o cargo de soberana-consorte: Maria Luísa de
Áustria.[145]
Após o período napoleônico, o Congresso de Viena levou os Bourbon de volta ao
trono da França. O conde de Provença, irmão de Luís XVI, foi aclamado rei com o
nome de Luís XVIII. Logo ao assumir
trono, o novo soberano procurou dar um enterro digno ao irmão e à cunhada. Seus
corpos foram encontrados graças ao advogado Pierre Louis Descloreaux, que vivia
na rue d'Anjou à época dos sepultamentos e lembrava-se da localização da vala
comum. Os restos de Maria Antonieta foram encontrados em
18 de janeiro de 1815. Embora seu corpo estivesse reduzido a uma pilha de
ossos, sua cabeça permanecia intacta. Os restos do rei foram
encontrados no dia seguinte. Em 21 de janeiro de 1815, vigésimo segundo
aniversário da morte de Luís XVI, houve uma procissão solene até a abadia de
Saint-Denis, onde os soberanos foram solenemente sepultados. Por essa época,
desenvolveu-se na França o culto à "rainha mártir", para que se
expiasse o pecado do regicídio e se idealizasse a vida de Maria Antonieta.
A história de Maria Antonieta
fascinou outras cabeças coroadas. A imperatriz Eugênia, consorte de Napoleão III de
França, lançou uma moda inspirada em Maria Antonieta e tentou
encontrar objetos pessoais da rainha para a Exposição
Universal de 1867.[145] Luís II da Baviera criou um culto à Maria Antonieta:
mandou erguer uma estátua da rainha noPalácio de Linderhof e sempre que passava por ela,
fazia uma reverência e acariciava seu rosto. Alexandra Feodorovna,
última czarina da Rússia, mantinha um retrato de Maria Antonieta sobre sua
escrivaninha, no Palácio de Inverno. No Palácio de Alexandre, em Tsarskoye Selo, havia uma tapeçaria de Maria
Antonieta que era visto como um mau presságio. Em 1896, durante uma visita
oficial à França, a czarina ficou feliz por dormir no quarto de Maria Antonieta
em Versalhes, enquanto os membros de sua comitiva também viam nisso um gesto de
mau agouro. O escritor e poeta Léon Bloy levou ao extremo o
culto à Maria Antonieta em seu ensaio "La Chevalière De La
Mort..."(1891),
onde a rainha é chamada de santa. Bloy, convertendo-se em advogado
de Maria Antonieta, pede o seu perdão em nome da França "Oh, mãe ultrajada (...)
peço-vos, em nome do Deus Misericordioso, a graça e o perdão para este pobre
povo." e conclui dizendo que, no Reino dos Céus "a esperam os fiéis
principios, os desgraçados privados da consolação terrena e a falange dos
mártires."
Nos últimos dois séculos a França
celebrou mais de uma vez a memória de Maria Antonieta: em 1927 e em 1955 (ano
de seu bicentenário de nascimento) foram organizadas exposições sobre a rainha
em Versalhes; em 2008, outra exposição, com pinturas e objetos,
teve lugar no Grand Palais. Hoje, Maria Antonieta também é considerada um ícone gay e, embora especula-se que sua
relação com a duquesa de Polignac fosse sentimental e não sexual, este tributo do
mundo LGBT,
segundo a historiadora Antonia Fraser, compensa os insultos vulgares de
seus contemporâneos. Protagonista de ensaios, filmes, histórias em
quadrinhos e desenhos animados, Maria Antonieta, por um
lado, é amada por sua vida romântica e trágica, por outro, continua a ter seus
detratores. Em 17 de julho de 2008, quase 215 anos após sua
morte, o ministro do exterior francês Bernard Kouchner, em nome da França,
desculpou-se oficialmente com a Áustria pela execução de Maria Antonieta.[156][157]
A relação
com Luís XVI
Luís XVI, aos vinte anos de idade,
por Joseph Duplessis, no Palácio de Versalhes.
Apesar de terem sido
completamente diferentes, tanto no comportamento quanto no físico, o casamento
entre o rei e a rainha da França foi descrita como agradável e feliz. Em geral,
a "covardia física" de Luís XVI e a "preguiça de alma" de
Maria Antonieta eram suficientes para evitar atritos entre ambos. A única sombra que pesava sobre a
vida do casal foi a não consumação do
casamentoem seus primeiros sete anos. Esse doloroso fardo exibido
pelos cônjuges diante de toda a corte que, à época, debochava dos insucessos
sexuais do casal, deixou uma marca indelével. Não sendo capaz de satisfazê-la
sexualmente, Luís XVI permitiu que Maria Antonieta se entregasse ao luxo e aos
prazeres frívolos. Havia, entretanto, muitas ações e comportamentos da esposa
que contrariavam o rei: suas vultosas despesas consideráveis, suas amizades,
o excesso de festas, entre outros. Maria Antonieta, no entanto, conseguia tudo
o que exigia do marido (exceto na política), que tinha uma complacência
ilimitada nos confrontos com a esposa, como a pedir desculpas por seus pecados,
que o faziam sofrer tanto.
A aquiescência do marido nos
confrontos faziam a soberana sentir-se superior a ele. Além disso, durante
anos, a imperatriz Maria Teresa e o embaixador Mercy exortavam Maria Antonieta
a conquistar uma certa ascendência sobre o marido, para manobrá-lo a favor da
Áustria, algo que, no entanto, não aconteceu. Mesmo Choiseul, com intenções
muito diferentes daquelas da imperatriz e do embaixador, teve a audácia de
aconselhar a rainha a usar "a doçura para conquistar o rei e o medo para
subjugá-lo." Todos esses episódios fizeram Maria Antonieta
pensar que era realmente superior ao marido, que não amava e cuja falta de
jeito no amor era para ela fonte de constante humilhação. A rainha chegou ao cúmulo de
chamá-lo de "aquele pobre homem", em carta enviada à mãe pouco
antes da coroação de Luís XVI.
A relação
com o conde Fersen
O conde sueco Hans Axel von Fersen, Castelo de
Löfstad , Suécia.
Diversos panfletos contrários à
Maria Antonieta atribuíam-lhe inúmeros amantes, tanto homens quanto mulheres.
Porém, a única relação plausível, platônica ou física passível de ter existido
seria com o conde sueco Hans Axel von Fersenque,
no entanto, nunca foi mencionado em nenhum dos famosos panfletos. Fersen,
segundo filho de um destacado diplomata sueco, tinha dezoito anos quando
conheceu Maria Antonieta, em um baile de máscaras. Desde então, o conde passou a
visitar Versalhes regularmente, onde era recebido com especial cortesia, mas
não mencionou em seu diário com a então delfina, que empenhava-se na montagem
de Iphigénie
en Aulide, de Gluck. Em 12 de maio de 1774, dois dias
após a morte de Luís XV, Fersen partiu para a Inglaterra, interessado em contratar
um casamento com uma herdeira. Malogrado esse possível casamento, Fersen
decidiu, em 1778, dedicar-se à vida militar e, como seu pai tivesse servido na
corte de Luís XV, o conde tentou a sorte com Luís XVI. Em 25 de agosto, a rainha
reconheceu entre as várias pessoas que lhe eram apresentadas, o jovem que
conhecera quatro anos antes. Fersen começou a frequentar a corte e o carinho
entre ele e Maria Antonieta, então grávida da Madame Royale, tornou-se evidente e no palácio
começou a espalhar-se maledicências sobre a inclinação da soberana pelo conde.
Este, apesar dos favores de que gozava, pretendia perseguir suas ambições
militares e resolveu embarcar para a América e combater na Guerra de
Independência Americana, que contava com o apoio francês, retornando
a Versalhes somente quatro anos depois, em 1783. Todos os possíveis casamentos de
conveniência foram deixados de lado e Fersen declarou, em carta à irmã, que
jamais iria se casar porque nunca teria a única mulher que realmente desejava,
Maria Antonieta. A rainha conseguiu que Luís XVI criasse o regimento
dos Suédois
Regals (Suecos Reais) e, desde 1785, Fersen fixou-se
permanentemente na França. Permaneceu ao lado da família real até a revolução e
teve um papel fundamental nos preparativos para a Fuga de Varennes.
Preservação
da Memória
Quando ocorreu a restauração da
monarquia e da dinastia dos Bourbon na França, após a derrota de Napoleão, o reiLuis XVIII, cunhado de Maria Antonieta,
transferiu seus restos mortais para a Basílica de
Saint-Denis, perto de Paris,
local de sepultura dos reis franceses. Por ordem dele foram erguidas duas
capelas: a primeira, na Praça Luis XVI, foi projetada como um mausoléu e marcou
o lugar onde os restos mortais de Luis XVI e Maria Antonieta foram
originalmente enterrados, chamada de Chapelle Expiratoire, hoje um monumento nacional da
França. A segunda capela foi erguida na cela de Maria Antonieta na Conciergerie, onde, na parede estão escritos
os nomes dos três mártires reais: Luis XVI, Maria Antonieta e Madame Isabel. Há
também, nesta capela, a transcrição de um trecho do testamento de Maria
Antonieta, no qual ela lembra, aos filhos, o que disse seu esposo Luis XVI,
sobre perdoar a todos por todo o mal que fizeram à sua família.
Representações
na cultura
Literatura
·
Le Chevalier de Maison-Rouge (1846)
·
Les Adieux à la Reine - Chantal Thomas (2002)
·
The Hidden Diary of Marie
Antoinette - Carolly
Erickson (2005)
Notas
1.
Na educação que recebeu, Maria Antonieta
nunca foi incentivada a concentrar-se nas aulas. Esta capacidade, geralmente
fácil de desenvolver nas crianças, era completamente ausente na arquiduquesa
quando adulta; algo notado até mesmo por seus admiradores. (Fraser, p. 43)
2.
A relação de Maria Antonieta com sua mãe,
sempre envolvida nos assuntos de Estado e afastada dos filhos menores, não era
muito profunda. Já na idade adulta, ela dizia: "Eu amo a
Imperatriz, mas a temo mesmo à distância. Quando lhe escrevo nunca me sinto
suficientemente confortável." (Fraser, p. 32)
3.
A Imperatriz acolheu o tutor de sua filha
como um de seus amigos mais próximos e convenceu-o a tornar-se seu espião, para
controlar os passos da jovem arquiduquesa na França. Maria Antonieta jamais
suspeitou que era traída por seu confidente. (Lever,p. 23-24)
4.
Também era comum tratá-la pelo
trocadilho "L'Autre-chienne", uma paronomásia em
francês das palavrasautrichienne, que significa "mulher
austríaca" e autre-chienne, que significa "outra
cadela". (Castelot, p. 233)
5.
Os condes d'Artois consumaram o casamento na
mesma noite, enquanto os condes de Provença nunca o consumaram. (Fraser, p.
110-112)
6.
A frase foi escrita por Rousseau no livro Confissões,
em referência a um evento ocorrido em 1741, quando Maria Antonieta ainda não
era nascida. (Lever, p. 422-423)
7.
Em carta ao rei Vítor Amadeu III da Sardenha, o embaixador
em Paris informou que a rainha estava tornando-se impopular e que era acusada
de "não amar o povo francês." (Lever, p. 154-156)
8.
Henri Louis de Rohan, príncipe de Guéméné era
um homem influente na corte de Luís XVI. Rico e bem relacionado, recebia
empréstimo de vultosas quantias de dinheiro em troca de sua influência junto ao
governo. Em 1782, após acumular uma dívida de 33 milhões de francos, o príncipe
foi obrigado a pedir falência. (Erickson, p. 196-197)
9.
Era voga no século XVIII a construção de
vilas semelhantes ao Hameau de la Reine e Maria Antonieta, a
exemplo de muitos nobres da época, não era imune aos modismos. Tal
extravagância era vista com naturalidade quando executada por um conde ou um
príncipe mas, por tratar-se de uma importante figura pública, a rainha foi alvo
de críticas impiedosas. (Fraser, p. 231)
10. "Eu
sei que, especialmente na política, eu tenho muito pouca influência sobre os
pensamentos do rei. Seria prudente de minha parte fazer uma cena com seu
ministro sobre assuntos que, certamente, o rei não me apoiaria? Sem qualquer
ostentação ou mentiras, faço os outros acreditarem que tenho mais influência do
que realmente tenho porque, se não os fizesse pensar assim, eu teria ainda
menos." (Lever, pp. 214-215)
11. Havia
muitos anos que Boehmer vinha propondo à rainha a compra de uma peça de grande
valor, inicialmente feito para a Madame du
Barry. Maria Antonieta, que não desejava comprá-lo, respondeu: "Se
tivesse esse dinheiro para gastar iria preferir melhorar minha propriedade em
Saint-Cloud." (Fraser, p. 252-253)
12. Em
1772, quando Maria Antonieta ainda era delfina, o cardeal de Rohan foi nomeado
embaixador em Viena e ridicularizou a imperatriz Maria Teresa: numa carta que
circulou em Versalhes, o cardeal chamou de "hipócritas"as
lágrimas derramadas pela imperatriz da Áustria durante a partição da Polônia. Desde então, a jovem
Maria Antonieta decidiu não mais falar com ele. (Lever, pp 86-87)
13. Maria
Antonieta creditava o pesado fardo que carregava à fraqueza do marido. "Meus
dias felizes se foram desde que fizeram de mim uma 'intrigante'",
disse ela, à época, à sua camareira, Madame Campan. (Haslip, p.
218-220)
14. A
pintura não teve boa sorte, apesar da grande semelhança. Na verdade, Madame Sofia,
a filha mais nova de Maria Antonieta, morreu antes da primeira exposição e teve
sua imagem retirada do quadro; a saúde do delfim piorava cada dia mais,
enquanto as outras crianças cresciam fortes e saudáveis. No final de agosto, a
pintura deveria ser oficialmente apresentada naAcadémie Royale, mas a
impopularidade da rainha havia crescido a tal ponto que temia-se por manifestações.
No salão, à moldura vazia, alguém anexou a seguinte nota:"Olhe para o
déficit" - referência ao novo apelido dado à rainha, Madame
Déficit. (Fraser, p. 284)
15. Viagens
misteriosas de vários amigos de Maria Antonieta a Londres - como o abade
Vermond, a duquesa de Polignac e a princesa de Lamballe - aumentaram os rumores
de que a rainha enviava emissários para negociar com a condessa de La Motte a
restituição de cartas comprometedoras. (Lever, p. 255)
17. Segundo
um de seus advogados, ela "não mostrou nenhum sinal de medo,
indignação ou fraqueza." (Lever, p. 402)
Nenhum comentário:
Postar um comentário